quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

NATAL E ANO NOVO.

DESEJO UM ÓTIMO NATAL A TODOS E QUE, EM 2011,
POSSAMOS SEGUIR COM LEVEZA OS RUMOS QUE A VIDA NOS SUGERE. 

El milagro

Porque si llega, cuando llegue,
legará como es:
fácil, claro, sencillo,
sin grandes resplandores,
sin que la tierra tiemble,
sin que el cielo se nuble.
Será suave y fraterno
con su mano en tu hombro.
No habrá cambiado casi nada:
sólo tu corazón.

Raúl Gustavo Aguirre











terça-feira, 7 de dezembro de 2010

PEÇA: FIO DAS MISSANGAS.

Queridos(as), se estiverem em Campinas, não percam o espetáculo: Fio das Missangas, peça baseada na obra do escritor moçambicano Mia Couto e apresentada pelo Curso Livre de Teatro.
Data: 10, 11 e 12 de dezembro sempre às 20h
Local: Barracão Teatro, Rua Eduardo Modesto, 128,
Vila Santa Izabel, Barão Geraldo – Campinas -SP
Reservas: 19-3829-4275 begin_of_the_skype_highlighting 19-3829-4275 end_of_the_skype_highlighting

UMA ENTREVISTA COM A DIRETORA DA PEÇA MELISSA LOPES:
Melissa Lopes, uma vida que se confunde com o teatro

A prosa mística, social e poética do escritor moçambicano Mia Couto será tema da próxima peça encenada pelo Curso Livre de Teatro do Barracão Teatro, que fica em Barão Geraldo, Campinas. A peça, com estreia marcada para a próxima sexta-feira (10/11), é baseada no livro de contos O fio das missangas que conserva, na sutileza das histórias curtas, as características essenciais da obra de Mia Couto, dentre elas, a presença de uma África onde graça a corrupção e o abandono, bem como de uma linguagem rica em metáforas e instantes poéticos que divide as páginas com as histórias fantasiosas e, ao mesmo tempo, bastante próximas da realidade de todos nós.

Se a inspiração para a peça vem das linhas literárias de Mia Couto, a organização do espetáculo e o preparo dos atores vêm da diretora Melissa Lopes, com a assitência de direção de Ana Clara Amaral e Eduardo Brasil, coordenador do Curso Livre de Teatro.

Melissa é formada em artes cênicas pelo Instituto de Artes da Unicamp e hoje trabalha como atriz pesquisadora e desenvolve projetos junto ao Grupo Matula Teatro, do qual faz parte há dez anos. O Grupo Matula, sediado em Barão Geraldo desde 2000, tem como proposta principal uma criação artística aliada ao olhar sobre a exclusão social, e dentro desta proposta desenvolve atividades fundamentadas no trabalho do ator, o que envolve criação e apresentação de espetáculos e metodologias de criação de personagens por meio da mimesis corporea e da máscara.

Para ampliar e aperfeiçoar o desenvolvimento de suas atividades, o Matula mantém algumas parcerias com outros importantes grupos de teatro da região de Campinas, como O LUME, o Boa Companhia e o Barracão Teatro. Na direção da peça Fio das Missangas, Melissa coloca em prática sua proposta de desenvolver atividades que tenham como base a preparação do ator e, neste caso, encara o desafio de trabalhar com pessoas que não são atores profissionais, mas que, segundo ela, “são apaixonados por teatro”.

Em entrevista concedida ao blog Educação Política, Melissa conta um pouco sua história profissional, fala sobre o prazer em trabalhar com novos atores e conta um pouco do desafio em trazer a prosa de Mia Couto para os palcos, desafio enfrentado não só por ela, mas principalmente pelos atores que, como ela mesma diz, precisam transcender o que está escrito no papel para poder traduzir em ação imagens nem sempre fáceis, que falam apenas no silêncio de uma prosa com gosto de poesia a costurar o tempo, a memória, a vida!

Agência Educação Política: Como se deu a relação com o teatro ao longo da sua vida? De que forma ele esteve presente em meio a planos, projetos e realizações que resvalam tanto no campo pessoal quanto profissional?

Melissa: Comecei no teatro com treze anos! Motivada por um professor de Educação Artística entrei para o grupo de teatro da escola. Foi amor à primeira vista! Até então eu só me imaginava jogando vôley, embora jovem, já fazia parte da seleção da minha cidade, Guarulhos/SP. Sempre gostei de atividades coletivas, tanto no vôley, como no teatro precisamos ter contato com mais pessoas e isso me estimulava muito. Aos 15 anos, decidi que queria ser atriz, me inscrevi na seleção do curso profissionalizante Teatro Escola Célia Helena e fui aprovada. Desde então não parei mais… aos 18 anos achei que precisava dar continuidade aos estudos, prestei vestibular em Artes Cênicas, na Unicamp e fui aprovada. No terceiro ano da faculdade, entrei num projeto que tinha como foco a metodologia de mímesis corpórea desenvolvida pelo LUME-Núcleo Interdisciplinar de Pesquisas Teatrais da Unicamp. Este projeto visava à observação de moradores de rua, na cidade de Campinas. Deste contato surgiu um projeto de extensão na Universidade, “Arte e Exclusão Social”(em 2011 está previsto o lançamento de um livro relatando esse trabalho) e nasceu o Grupo Matula Teatro, do qual faço parte há dez anos.

Melissa como artista de circo no espetáculo Gran Circo Máximo, do Grupo Matula Teatro

Desse trabalho com a população de rua, desenvolveu-se a linguagem estética do grupo e que nos guia até hoje, uma criação artística aliada ao olhar sobre a exclusão social. Já trabalhamos com mulheres assentadas do MST, mulheres que vivem na periferia e famílias de circo que rodam pelas periferias das grandes cidades. Paralelamente sempre continuei na Universidade, atualmente faço doutorado, já trabalhei em diversas instituições de ensino técnico e superior.



AEP: A prosa de Mia Couto é considerada no meio literário como representante de uma das mais belas e expressivas tradições da literatura de cunho regionalista e relevância social. O escritor alia temas da realidade social e humana de uma África que ele diz explorada e abandonada pelos próprios africanos a uma linguagem mística fortemente poética que combina a graça e sutileza de inúmeras metáforas a um encantamento que prende o leitor em uma narrativa que beira as raias do fantástico. Por que Mia Couto para o teatro?

Qual a melhor forma de traduzir palavras inscritas na forma muda das letras em voz, expressão corporal e existência plena sobre o palco?

Melissa: O Matula estreou esse ano em parceria com o ator Eduardo Okamoto, o espetáculo Chuva Pasmada, baseado em um conto de Mia Couto. Montar os contos do livro “O fio das Missangas” foi uma coincidência boa, as palavras de Mia são pura poesia e memória, por mais que ele se dirija à realidade da África, nos identificamos com cada uma das histórias porque os temas tratados são universais.

Quando digo que foi uma coincidência, isso se deve ao fato dos alunos do Curso Livre de Teatro terem pedido para montar um espetáculo a partir de imagens do cotidiano que muitas vezes não enxergamos. Muitos dos contos que fazem parte do livro O Fio das Missangas aborda essa questão, então foi um bom casamento.

A melhor forma de traduzir a literatura para o teatro é brincar com as imagens que o autor nos oferece e saborear cada uma das palavras que aparecem nos contos. Muitas das imagens que surgem são bem difíceis de traduzir em ação, o que gera um desafio grande para os atores, pois eles precisam transcender o que está escrito no papel.
Curso Livre de Teatro durante ensaio da peça Fio das Missangas

AEP: Você acredita que um texto literário quando bem interpretado no espaço teatral é potencializado e passa por uma espécie de resgate da sua essência primeira e original? Daquilo que nele pulsa e vive por meio das letras, das decisões linguísticas, do virtuosismo estético e da construção formal?

Melissa: Sim. Mas os envolvidos no processo da montagem teatral precisam se deixar contagiar por cada uma das imagens e dar importância a cada uma das palavras escritas pelo autor. O Fio das Missangas começa com a seguinte expressão: “A missanga, todos a vêem. Ninguém nota o fio que em colar vistoso vai compondo as missangas. Também assim é a voz do poeta, um fio de silêncio costurando o tempo”. Esta epígrafe revela um pouco o que Mia Couto pensa sobre a função ética do poeta: dar voz àquilo que as pessoas veem, mas não enxergam.
Assim também é o papel que o ator deve desempenhar em cena: levar ao palco aquilo que o espectador não enxerga ou simplesmente se esqueceu que existe.
AEP: A um autor anônimo do século XX, atribui-se o seguinte pensamento: “o ser humano é um animal místico”. Serviria esse pensamento como uma espécie de epígrafe auto-explicativa para a obra de Mia Couto não por defini-la, posto que em literatura ou arte as coisas não passam pelo crivo da definição que limita, mas por revelá-la?
Melissa: Pensando na obra de Mia Couto eu complementaria a frase: “o ser humano é um animal místico, mas que ao mesmo tempo é de carne e osso e traz consigo um arsenal de memória”. Nos textos de Mia, as dores e os prazeres que permeiam as histórias são tão reais, que muitas vezes ecoam no leitor e acontece um processo de identificação.
AEP: Teatro por teatro seria ele uma forma de fugir da realidade ou de encontrar-se novamente com ela?
Melissa: As duas coisas! O Teatro é a arte do encontro! Encontro com o sombrio, com o obscuro, o que dá medo…encontro com o desejo, com o que enobrece. Encontro com o outro, encontro consigo…
AEP: No Barracão Teatro você trabalha com atores que não são atores por profissão, ou seja, eles trabalham em outras áreas, mas buscam o teatro como forma de expressão, talvez de existência plena fora dos limites e condicionamentos de uma sociedade que cede cada vez menos aos impulsos e às emoções, sendo praticamente invadida por um corrente de razão e informação. Como é o trabalho com esse atores? O desafio é maior, há alguma diferença em trabalhar com eles e com atores formados na área e que se dedicam exclusivamente ao teatro?
Melissa: Nenhum grupo de alunos é igual, independentemente se são atores profissionais ou não. No caso específico desse grupo que formou a turma de 2010 do Curso Livre de Teatro existiu uma relação bem diferenciada, pois embora seja uma turma muito eclética (um jornalista, um engenheiro de petróleo, uma cineasta, uma dançarina, uma terapeuta ocupacional, um filósofo, um músico, um administrador e um estudante de ensino médio), todos são apaixonados por teatro! Eles compraram a idéia do espetáculo desde o início e trabalharam muito dentro e fora de cena, os adereços, figurinos, trilha sonora e a produção foram feitas por eles e essa é uma qualidade muito difícil de conquistar em um grupo.
Quando trabalhamos com atores profissionais, é muito comum ver uma preocupação com a técnica, aos poucos aquele brilhinho apaixonado que aparece nos olhos vai sumindo e o mais importante é a performance, o desempenho como ator.
Isso acontece ao contrário em alunos que não tem o teatro como profissão, pois eles não se preocupam tanto com isso e ao mesmo tempo se deixam atravessar pela história, pelos personagens e principalmente pelo prazer de estar em cena.
Ambas experiências são desafiadoras e estimulantes. No meu caso, quando sou professora me sinto contagiada e provocada a criar quando encontro uma turma tão animada quanto essa do Curso Livre de Teatro.
AEP: Qual é o mundo que você vê quando está no palco, quando surpreende-se na personagem, quando divisa a plateia?
Melissa: Quando estou em cena eu vivo a personagem! É muito diferente a cada espetáculo e a cada plateia. Por exemplo, no Matula, atualmente eu faço parte de dois espetáculos, o Gran Circo Máximo e o Agda. No primeiro faço uma artista de um circo decadente, esse circo só tem três artistas trabalhando, por isso dentro do espetáculo faço pelo menos cinco personagens internacionais, exatamente como vimos na realidade das famílias de circo que rodam pela periferia de Campinas e região. O espetáculo é cheio de detalhes, não tem muito tempo para pensar, eu entro e saio de cena cada hora com um figurino. Com relação à platéia, a peça acontece em uma pequena lona de circo, a relação é muito próxima, se eu sair da personagem, o público percebe, mas o espetáculo é tão intenso que não dá tempo para isso, ali eu sou a Diodene Herrera que quer muito que o circo sobreviva!
Já no caso de Agda, baseado no conto da Hilda Hilst, o texto é inteiramente poético e dramático, faço um personagem masculino (Celônio) e outro feminino (Agda) com mais duas atrizes em cena, a atenção é voltada para a palavra e as imagens que são geradas por ela. É bem difícil, mas ao mesmo tempo é uma delícia se colocar no lugar desses personagens, falar de amor, falar de vida, me faz refletir e repensar sobre minha própria vida. Neste caso, a relação com o espectador é distante, o texto é bem complicado, então eu tenho que estar totalmente envolvida senão o espetáculo não acontece.
AEP: Na sua opinião, o que é mais importante para um ator ou qualquer artista de forma geral: o aplauso ou o silêncio?
Melissa: Acho que nenhum dos dois, o mais importante é o tempo presente. Explico, quando me apresento para uma platéia, aquela uma hora em que acontece o espetáculo é um momento entre eu e o espectador que jamais poderá ser repetido, e por isso se torna um instante sagrado.
Tem outro momento que também acho muito importante e que poucos atores comentam, que são os últimos 5 minutos antes do espetáculo começar. Eu fico bem nervosa, ali eu faço acordo com o “Divino”, dedico o espetáculo para alguém especial e sem pensar muito entro em cena com frio na barriga. Depois, em cena, me delicio!
AEP: O que é o teatro pra você em uma palavra?
Melissa: Vida (mas, acho que diria: A Minha Vida)
E a arte?
Melissa: Paixão (dessas que movimenta e gera movimento)