terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

GOMORRA ESTÁ AQUI.

Estreando nos cinemas Gomorra chega para sujar o imaginário da máfia italiana. Como bem indicou a revista Bravo deste mês, não é mais o Glamour e o charme de um Poderoso Chefão, com um Don Vito Corleone que definiu até como os mafiosos falariam depois de seu lançamento. Não são mansões ou piscinas cheias de lindas gatinhas. Não mais carros vermelhos e arruaças impunes. A máfia de Gomorra (corruptela para Camorra, o nome da máfia mais influente agora) está sempre à sombra, sempre em apartamentos pequenos e sujos, feios, decrépitos. Mas não por isso menos atuante, mortes por encomenda, controle de áreas para tráfico, arregimentação de novos membros etc.
Mas é outro o filme que vêem à lembrança ao assistir Gomorra. Um outro que também apresenta vidas desperdiçadas, que pouco perderiam em atirar-se a um precipício, e pouco ganhariam ficando inercialmente onde estão. Paradise Now de 2005 colocava-nos frente a dois jovens, desempregados, perdidos, perdidos para si e para o mundo, a eles pouca diferença faria morrerem ou ficarem em um simulacro de vida. Optam, sem fazer uma "opção", por ser homens-bomba, e atacar do modo possível aquilo que lhes parece e lhes é apresentado como o inimigo. O final do filme, um dos melhores já feitos no cinema, diz tudo sobre a possibilidade de mudança. Silêncio, no hay banda, silencio.
Os jovens de Gomorra morrerão. Como cartas num baralho sempre renovável, morrerão. Adiantaria viver para quê? E adiantaria morrer pelo quê? Vistos os filmes em seqüência cronológica de lançamento, temos menos alternativas ao final. O Palestino morria por algo idealizado, um paraíso deslumbrante e a citação no livro dos mártires. Os italianos morriam "porque sim". Ter um ideal ou não nada muda, morrer pelo paraíso, por Deus ou por uma moto potente não muda nada. Não se defende o idealismo, apenas se reafirma que o niilismo destroça mais eficazmente ao não se ter nada para agarrar. Ao perder-se tudo, pode-se ao menos morrer. Ao não ter nada, nem isso.
Não é casual que o título Gomorra se sobreponha ao nome da máfia, é fácil pensar na cidade destruída por Deus. Não havia um só piedoso a ser salvo, não havia remédio que não a purgação no mundo dessa cidade-pecado. Mais uma idealização, a sabedoria bíblica versus o mundanismo niilista, poderíamos pensar que os que morrem pelo deus cristão estão a salvo...
Gomorra está aqui.
(Albor Vives Reñones, pesquisador do grupo Violar)

Um comentário:

  1. Sim,Albor, Gomorra está aqui. Acabei de ver o filme. A desesperança está em todo lugar. Viver para quê? Morrer pelo quê? No quê acreditar para viver ou para morrer? Acredito sim nas várias formas de luta que existem em nossas cidades e que se opõem à ganância cruel de grupos poderosos. Muitas dessas resistências são invisíveis, porque estão fora de nossas referências usuais, mas estão lá a nos alertar, a nos convocar para a construção de um mundo melhor.
    Abraço.
    Áurea.

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