domingo, 26 de abril de 2009

PARA ALÉM DOS INTERESSES DA CRIANÇA,UMA DISPUTA DE PODER

Queridos(as) Leitores(as)
Estou encaminhando para vocês um artigo de Tatiana Lima Almeida, do grupo de pesquisa Violar. Nele, Tatiana nos traz novos elementos para refletirmos sobre os textos postados neste blogue a respeito do fechamento das escolas em assentamentos do MST. Façam os seus comentários, opinem.

Os textos “Educação, MST e novas subjetividades, “O MST e as escolas itinerantes” e “Violência em Sarandi”, postados neste blog no mês de abril, têm me suscitado uma reflexão sobre o papel do Estado na Garantia de Direitos da criança e do adolescente no Brasil. Ficou claro para mim que o fechamento da escola no assentamento revela uma disputa de poder que transcende o Superior Interesse da Criança.
Fechar uma escola por não estar regulamentada dentro das diretrizes governamentais e depois punir as famílias e o movimento por não aderirem ao modelo formatado pelo Estado? Fica evidente que a última preocupação foi o Superior Interesse da Criança.
A ação do Ministério Público, executada através dos obedientes Conselheiros Tutelares, revelou uma total capacidade de se ater a uma partícula apenas do Estatuto da Criança e do Adolescente, contemplada em um de seus artigos, que preconiza o Direito à Educação e a obrigatoriedade da matrícula na rede regular de ensino. Ora! Se vamos falar em Lei, então que falem com respeito àqueles que tanto lutaram por definir diretrizes que garantam o Superior Interesse da Criança.
O ECA prevê a garantia de Direito à Educação e também a garantia de acesso, porém afirma ainda em seu artigo 3º que sejam asseguradas “todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.” .
Mais detalhado, este direito está descrito no Capítulo II, configurado como um dos Direitos Fundamentais -“DO DIREITO À LIBERDADE, AO RESPEITO E À DIGNIDADE"-, Art. 16 – O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos: ... “VI - participar da vida política, na forma da lei”. Art. 17 – “O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.”..
Quanto ao DIREITO À EDUCAÇÃO, descrito no capítulo IV, indica em seu Art. 58 – “No processo educacional respeitar-se-ão os valores culturais, artísticos e históricos próprios do contexto social da criança e do adolescente,...”.
Ampliando ainda mais, podemos resgatar da Convenção sobre os Direitos da Criança (1989), promulgada com Lei Internacional em 1990, o fato de ser reconhecido que em todos os países existem crianças vivendo sob condições excepcionalmente difíceis e que essas crianças necessitam "consideração especial", priorizando a importância das tradições e valores culturais de cada povo para a proteção e o desenvolvimento harmonioso da criança. Ou seja, o foco é o Superior Interesse da Criança.
Pensando nessas premissas, o que legitima o fechamento de uma escola comunitária pelo Estado? Qual o respeito à história, à cultura e ao contexto dessas crianças e adolescentes? Como falei no início, demonstrou-se uma total incapacidade em enxergar a totalidade e uma tendência em apegar-se à uma partícula que fundamenta ações de punição e coerção.
Porque a escola comunitária não pode ser regulamentada e reconhecida?
Hoje, discute-se a perspectiva das práticas territorializadas e das práticas territoriais. A primeira consiste em levar ações a um lugar em um formato pré-moldado. A segunda em colocar o território no papel de ator, onde as ações partem dos atores do lugar que se faz (re) descoberto à medida do trabalho coletivo. São ações planejadas e desenvolvidas com a participação dos atores locais (Dirce Koga).
Esta perspectiva de território tem favorecido as ações de desenvolvimento local, a partir do contexto histórico, cultural, político de cada região. No entanto, fomentar ações neste sentido abre um leque de possibilidades que ameaçam uma política de controle social hegemônico.
ALMEIDA, Tatiana Lima.

4 comentários:

  1. Oi Tatiana! Achei brilhante a sua colocação! Você vai ao ponto e mostra como a questão que tem pautado as ações do ministério público não é a defesa dos direitos da criança e do adolescente, mas, sim, a punição do movimento!
    Um abraço, Zé!

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  2. Tatiana... parabéns pelo texto!
    Realmente, o que se observa é um ato hipócrita, em nome da lei e dos direitos infantis, o ministério público prejudica aqueles a quem deveria ajudar, desrespeita a individualidade e a identidade daqueles que deveria apoiar: as próprias crianças e adolescentes! Lamentável...

    Elise

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  3. que bacana Tatiana, muito bom! lembrei do Milton Santos qdo vc fala no fim, do poder hegemônico e tal...o movimento, e essa escola enquanto 'lugar' segundo Milton Santos, "espaço do acontecer solidário que definem valores de múltiplas naturezas (culturais, antropológicas, econômicas, sociais...)" e isso sim já pode ser mesmo uma resistência ao já instituído né...bjo!

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  4. É mesmo lamentável e equivocado ações ridículas como essas e tantas outras do "nosso" Estado...

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